domingo, 18 de abril de 2010

Menino-homem ou Sonhos da Madrugada

Sobre o leito a luz pálida da madrugada se derrama.

Nostalgicamente suave, ilumina seu dorso nu. Menino-homem, beleza intrigante que tanto me fascina. A pele branca se destaca nos lençóis, evoca lembranças,tempos de antes, talvez de nunca mais.

As mãos

deslizam suaves, movimentos contidos, profiláticos. Derramam calma, massageiam na tentativa de aliviar a dor. Espalham ungüento, tentam espalhar amor enquanto unhas vermelhas passeiam, contrastam, emanam um sentimento que sufoca na garganta mas explode nos olhos, no mover-se contido pelo medo que se rompa o encanto do tênue momento.

Um

toque pode substituir mil palavras e teu dorso sob minhas mãos – amordaçadas pelos limites que impuseste a elas – são um conforto, meu dicionário, meu púlpito, onde discurso saudades e carinho.

Tua

cabeça no meu colo, teus cachos semi-espalhados no travesseiro e a idéia de um querubim de Michelangelo, a vontade é de te estreitar no colo e não mais te deixar partir.

Teu

corpo em carrara esculpido, exemplar perfeito de uma anatomia privilegiada e meus olhos que correm adivinhando o que não posso tocar...

Teus

olhos fechados, teus cílios longos e que sonhos será que estão a sonhar?

Meus

dedos entrelaçados nas voltas dos teus cabelos, meus sonhos perdidos nos seus fios , meus sonhos tentando se infiltrar e teu pulo sobressaltado, teu abraço cansado e a noite que nos cobre num sono quase sem sonhos.

Teu

abraço reconfortante a conciliar-me o sono, tua cabeça no meu colo, final de tarde e a luz vermelha entrando pela mesma janela. Tua negativa veemente afirma teu esquecimento, mas meu sonho é esperança: como o sol, renasce e morre a cada dia!

Carceres



Li um texto sobre os embarcados, pelos navios e mares do mundo. Parei para pensar no estado de confinamento, neste caso, por uma questão de trabalho, e fiquei a pensar o quanto somos livres ou o tanto que somos encarcerados, mesmo em terra firme e livre de espaços limitados.Como é viver no cárcere da vida que temos, cheia de horários, trabalhos muitas vezes desgastantes e que chegam até a deprimir o mais alegre dos homens que trabalham com as mazelas alheias.O cárcere em que vive o juiz, que precisa mandar prender aquele jovem que mal sabe da vida, mas que já descobriu um caminho estranho, da violência, da morte. Este também vive em seu cárcere particular, pois que iniciou uma trilha da qual dificilmente conseguirá desistir, talvez ao morrer, em algum confronto com policiais e justamente para não ser preso e encarcerado em alguma prisão onde sua vida também poderá ser ceifada se lá estiverem outros encarcerados e seus inimigos declarados.Também pensei no cárcere físico, naquele em que o cristão em tudo pensa, em tudo percebe que o cérebro é capaz de urdir os mais complexos pensamentos, mas que é incapaz de mover um só músculo, sequer pode falar e expressar o que sente. Talvez seja esse o mais terrível dos confinamentos. Todos mexem em você, no seu corpo, que não reage, só cumpre funções vitais que você não controla, isso quando não precisa que uma máquina ou dispositivo qualquer que execute essas funções. Aí você fica dependente da energia elétrica que movimenta essas máquinas. Melhor morrer? Talvez. Mas você nem consegue pegar nada para dar fim à própria vida. É inexorável a vida até que suas funções vitais iniciem um processo macabro de autodestruição enquanto você observa a degeneração de sua própria vida. Cárcere maldito, esse.Outros cárceres interessantes são àqueles ligados às emoções. Nossa! Esse também é cruel. Esse tipo de confinamento nos prende a emoções estranhas, que não queremos mais sentir, mas que das quais não conseguimos nos livrar. Quais seriam elas? Cada um tem as suas, bem delimitadas ou não. Mas elas existem, e nos fazem sofrer. Cárceres que muitas vezes são erguidos por cada um, como você querer viver algo e não se permitir, querer alguém e esse alguém não quiser ser seu, querer ir para um lugar e isso não ser possível. Isso é um impedimento e, se assim o é, não deixa de ser um cárcere, que priva de se andar pelo caminho desejado, pela emoção a ser vivida.Talvez a expressão cárcere, uma prisão institucional, não se enquadre no escrito aqui. Mas faz diferença se há um confinamento institucional, com a cela e suas grades e as próprias “prisões” que visitamos dentro de nós mesmos? Nenhuma. Todas prendem.Todavia, só por alguns momentos, diária ou constantemente, nossos cárceres são destruídos, desarmados. Isso acontece quando você consegue parar e perceber que determinados acontecimentos são únicos e especiais em sua vida. E quando isso acontece? Quando é possível “libertar” a mente, o pensamento e ver o que está à volta, mesmo que isso nos faça chorar, do nada, de emoção por estar livre ali, ao ver o mar, o pôr do sol, a lua linda (em qualquer das suas fases), o folguedo infantil e barulhento das crianças, aquele PPS lindo com aquela música que faz você lembrar de algo que foi muito bom em sua vida, o vinho à beira da lareira que faz um show com suas labaredas só para você. Ufa, tantos momentos livres, tanto a comemorar os rasgos de liberdade que a vida nos dá, e que nos permitimos viver.Sim, todos temos nossos cárceres, e creio que se não os tivéssemos, seríamos nem tanto livres, mas muito libertinos, rsrsr, o que também seria complicado. Então, aproveitemos nossos cárceres e nossa liberdade.

Que cada um nos torne melhores.

Lívia

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Sobre morrer e outras coisas mais...

Hoje é segunda-feira gorda, como se dizia antigamente, muito antigamente quando eu era criança, segunda de carnaval, de folia e alegria, puro descompromisso e o telefone me acorda com a noticia da morte de um amigo...

Não era um amigo pessoal, intimo, de infância, não...Justiça seja feita, era amigo daquele que eu havia escolhido como companheiro, e eu mesma o vi por duas ou três vezes no máximo, mas foi o suficiente para gostar dele, sentir sua alma sensível, seu bom caráter, sua aura iluminada!

A noticia me pegou pelo calcanhar , me derrubou no chão, me puxou pelos cabelos e me lembrou o Pedro Bial – num excelente texto - quando diz que a morte é uma piada de mal gosto, muito mal gosto! Bial tem toda a razão, morrer não tem graça alguma, principalmente para quem fica!

E os planos do cara? Ele tinha acabado de passar em primeiro lugar num concurso público, tinha um filhinho, amores, sonhos, projetos e aí fica tudo ali , empoeirando e a vida vai seguindo sem pressa e nem comprometimento, mas quem conhecia ele, que já o ouviu tocar ,falar, olhou dentro dos seus olhos, ou abraçou seu corpo carinhosamente – imagino que isso tenha acontecido algumas vezes – fica aqui sem poder repetir, sem ter como dizer tchau, sem adeus, sem ponto final. Que piada mais sem graça!

Sem pé nem cabeça, a morte de alguém saudável, jovem, cheio de planos, deveria nos fazer refletir sobre a urgência de dizer e demonstrar coisas como “eu te amo”, “eu gosto de você”, “você é importante para mim”. Piadas como essas deveriam nos levar a pensa que a vida é fugaz e acaba a qualquer momento sem que tenhamos tempo ou aviso prévio para finalizar todas as coisas que deixamos para fazer um dia, quando for possível, quando eu tiver certeza, quando chegar a hora.

Eu que já perdi duas pessoas muito importantes assim, no estalar dos dedos, sei o quanto dói um dia acordar e descobrir que não haverá outra chance de conversar, outro beijo, outro abraço, uma possibilidade de dizer apenas adeu...

A certeza do fim peremptório, não o fim humano que pode a qualquer momento ser reduzido a um novo começo, a uma amizade, a algo suave e não doloroso, o fim mesmo, sem outra chance, sem oportunidade qualquer, dói demais e não some nunca da nossa alma, fica lá e, ao menos uma vez ao ano, de vez em quando volta e lhe arranha com a certeza de que poderia ter sido diferente, ao menos um pouco diferente.

Que piada mais sem graça para uma segunda-feira de carnaval!

sábado, 26 de dezembro de 2009

Natal

Durante dois terços do mês as pessoas correram como abelhas de uma colméia em ebulição. Azafamaram-se em torno do grande dia, buscaram enfeites, presentes, componentes para a ceia, roupas, sapatos, jóias... Pouquissimos pararam para refletir , para montar a festa no seu inteiror e enfim é Natal!

Chegado o dia, casas prontas, roupas prontas , presentes nas árvores e crianças ansiosas...Ceia servida, presentes entregues, um festival de papéis rasgados...Crianças sonolentas, adultos cansados, pratos sujos e o que restou do Natal? A esperança de que o próximo ano seja melhor, que Papai Noel seja mais generoso, que possamos passar a ceia a bordo de um transatlantico???

O Natal tem que existir primeiro dentro de você do seu coração...Lembro da minha infancia e de minha avó. Em sua casa não havia tradição de ceia, havia, sim, um jantar melhor a meia-noite, mas era algo infinitamente diferente do que hoje se chama ceia. Eu costumava ir para a casa da irmã mais velha do meu pai, passavamos lá o começo da noite, até a missa.

Minha tia morava na cidade, minha avó na fazenda, então íamos para a cidade e eu brincava feliz na roda gigante, nos barcos puxados por cordas grossas, nas ruas da pequena cidade. Depois subia a rua e me sentava com um monte de primos na calçada da igreja para assistir a missa de Natal a qual nenhum de nós prestava muita atenção, mas assistiamos piamente e desciamos a ladeira com a sensação de dever cumprido. Na casa de minha tia se estourava um champanhe, se abria alguma bebida, sempre inacessivel a nós, crianças, e se jantava...

Diga-se de passagem que minha tia cozinhava muito bem! E suas sobremesas? Eram verdadeiras iguarias do olimpo, manjar dos deuses. Eu voltava para a fazenda dormindo, cansada, feliz e acordava sobressaltada sem a certeza absoluta que Papai Noel houvesse passado por la, mas sempre encontrava uma profusão de brinquedos, um mundo de sonhos e minha avó ali, a perguntar ingenuamente o que ganhei, a compartilhar minha felicidade de criança, a dar-me aquele alimento indispensável a alma: amor!

Nos Natais de hoje é tudo tão diferente e já adulta ainda sinto saudades da casa de minha avó acordando cedo para descobrir os presentes, da casa de minha tia e suas comidas, das missas na calçada da igreja...Sinto saudades dos meus Natais que já não existem mais!

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Ciclo da Vida


Ao nascer, perdemos o aconchego, a segurança e a proteção do útero. Estamos, a partir de então, por nossa conta. Sozinhos. Começamos a vida em perda e nela continuamos. Paradoxalmente, no momento em que perdemos algo, outras possibilidades nos surgem. Ao perdermos o aconchego do útero, ganhamos os braços do mundo. Ele nos acolhe, nos encanta e nos assusta, nos eleva e nos destrói. E continuamos a perder. E seguimos a ganhar. Perdemos primeiro a inocência da infância. A confiança absoluta na mão que segura nossa mão, a coragem de andar na bicicleta sem rodinhas por que alguém ao nosso lado nos assegura que não nos deixará cair. E, ao perdê-la, adquirimos a capacidade de questionar. Por que? Perguntamos a todos e de tudo. Abrimos portas para um novo mundo e fechamos janelas, irremediavelmente deixadas para trás. Estamos crescendo. Vamos perdendo aos poucos alguns direitos e conquistando outros. Perdemos o direito de poder chorar bem alto, aos gritos mesmo, quando algo nos é tomado contra a vontade. Perdemos o direito de dizer absolutamente tudo que nos passa pela cabeça sem medo de causar melindres.... E aprendemos. E vamos adolescendo e ganhamos o mundo. Neste ponto, vivemos em grande conflito. O mundo todo nos parece inadequado aos nossos sonhos. Ah, os sonhos!!! Ganhamos muitos sonhos. Sonhamos dormindo, sonhamos acordados, sonhamos o tempo todo. Aí, de repente, caímos na real! Estamos amadurecendo, todos nos admiram.Tornamo-nos equilibrados, contidos, ponderados. Perdemos a espontaneidade. Passamos a utilizar o raciocínio e a razão acima de tudo. Mas, não é justamente essa a condição que nos coloca acima dos outros animais? E continuamos amadurecendo ganhamos um diploma, um emprego, um carro, um companheiro. E desgraçadamente perdemos o direito de gargalhar, de andar descalço, tomar banho de chuva, lamber os dedos na frente dos outros... Mas, perdemos peso!!! Já não pulamos mais no pescoço de quem amamos e tascamos-lhe aquele beijo estalado, mas apertamos as mãos de todos, ganhamos novos amigos, ganhamos reconhecimento, honrarias, títulos honorários e assim, vamos ganhando tempo... enquanto envelhecemos. De repente, percebemos que ganhamos algumas rugas, algumas dores nas costas (ou nas pernas),... ganhamos celulite, estrias. E perdemos cabelos. Nos damos conta que perdemos também o brilho no olhar, esquecemos os nossos sonhos, deixamos de sorrir. Perdemos a esperança. Estamos envelhecendo. Não podemos deixar pra fazer algo quando estivermos morrendo. Afinal, quem nos garante que haverá mesmo um renascer? Exceto aquele que se faz em vida? Que a gente cresça e não envelheça simplesmente. Que tenhamos dores nas costas e alguém que as massageie. Que tenhamos rugas e boas lembranças. Que tenhamos juízo, mas mantenhamos o bom humor e um pouco de ousadia. Que sejamos racionais, mas lutemos por nossos sonhos. E, principalmente, que não digamos apenas eu te amo, mas ajamos de modo que aqueles a quem amamos, sintam-se amados mais do que saibam-se amados. Afinal, o que é o tempo?
É nascer, crescer, adolescer, amadurecer, envelhecer, morrer.
Até pode ser contado como fases que passam, períodos de tantos sentimentos e atividades.
Mas na verdade, o tempo não conta... pois ele não é nada em relação à vida...
Pois a vida muda de fases como a lua, mas não acaba...
Só nos transforma em seres melhores, completos, maiores...

Autor Desconhecido

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Pssss, silêncio!


Psssss, silêncio. Será que ele é tão aterrador assim? Será que ele assusta tanto? Não pode ser. Sabe o que eu acho? Que você não sabe ouvir o silêncio e todos os recados que ele trás. Pena. Do silêncio que eu gosto, você tem pavor. No silêncio que eu vivo, ouço a mais bela música que toca no meio de tantos pensamentos que gritam, em silêncio. Você não o ouve ? Mas é nele que me refugio. É nele que ouço o meu burburinho que me sai das entranhas como um grito que ninguém ouve. Nem quero que ouçam, pois que são meus e poderiam não ser entendidos. Você deve ter os seus. Ouça-os. Ou não. Sem problemas.
Ah, o silêncio. Mercadoria rara e cara, digna dos grandes reis e meros mortais. Á beira do fogo que consegue ser audível a poucos, o silêncio se torna o único e perfeito amigo. Ninguém mais. Ninguém seria parceria para ouvir o tal silêncio que tudo diz e pouco revela de si mesmo, em uma grande busca pela revelação de algo que nem sei mesmo se vou encontrar, ou se quero isso. O que importa? O silêncio me dará as respostas mesmo assim. Tanto faz se elas me farão sangrar. Nada mais importa a não ser o que ouvirei do silêncio que você não gosta, que me é caro e que tudo me mostra. Muitas verdades, outras mentiras que eu juro serem verdades por que assim você me contou. Não. Ele não mente pra mim. O silêncio me mostra e eu me encarrego de acreditar em todas as verdades ou em algumas mentiras que eu, quero acreditar, são verdades. Mentira. Minto para mim mesma. Não importa. “Acredito” nelas, pelo menos deixo você pensar assim. São mentiras daquelas que me fazem bem, mas que sei que me custarão caro. O silêncio de agora não me deixa fugir, nem de mim mesma. Ele pode ser tudo aquilo que eu esperava, mas também pode ser brutal, corrosivo, e está sendo. Não me poupará, porque grita de dentro de mim, enquanto só ouço os barulhos, que nem entendo deste mundo aqui fora, da algazarra dos carros, das crianças, mas não estou nele, apenas o observo e escapo deles. Impossível fugir, embora tente. Tristeza. Deixo-me vagar pelo meu silêncio que raramente encontro. Pelos céus, quanto custa um silêncio ? Por que ele é tão escasso? Grito para saber onde o encontro.
Sons, ah, os sons, poderia ouvir Mendelsonn, Bach e ouviria o silêncio límpido desses quase mantras que me extraem dessa modorra que é a falta de silêncio. Você ouve o silêncio? Enxerga a ausência dos sons estridentes? Seu ponto “G” ? Onde fica ? O meu ? Fica no ouvido. Sim, ele é capaz de me seduzir com uma intensidade tal que parece ser até o mais profano dos desejos. Quem? Ele, o silêncio. Profano e ao mesmo tempo divino. Para mim o é. Para você, não?
Sua busca é cansativa, mas recompensadora. Ele é meu. Nem sei se pode ser partilhado com você. Talvez apenas comigo mesma, pois que acho que quase ninguém o valoriza tanto assim.
Como uma jóia rara, buscadas nas entranhas das terras antigas e longínquas em incansável busca da qual não poupo esforços para obtê-la. E eis que descubro o meu tesouro. Puro, com um brilho único, jóia nunca imaginada e nem forjada pelos melhores ourives russos e nem suíços. Jamais fariam tal beleza, pois que não existe imaginação, criatividade tamanha para que me apresentem tal jóia.
E então? Onde o encontrarei? No silêncio, que é meu, único, indevassável, personalíssimo.
Infelizmente, acho que não posso partilhá-lo com ninguém, uma vez que não ouviriam o meu silêncio. Lástima. Ficarei com a sensação que sou um ser estranho. E o que isso importa? Mas você deve ter o seu silêncio. Antes, psssss, faça silêncio, ou você não poderá ouvir o que ele diz.

Lívia, dez, 2008

sábado, 17 de outubro de 2009

Ser um Ser Humano


De todas as coisas que se passam no mundo, para mim, a única incompreensível é a natureza do ser humano. Pode? Eu sendo um ser humano, isso deve significar que minha natureza não é acessível ao meu próprio entendimento. Bem... quem precisa se conhecer, não é mesmo? Que graça teria saber de antemão que reação teríamos frente à determinada atitude do outro? Pois é. Aí é que reside a incompreensão. Como saber, entender o porquê do outro assumir atitudes meio estranhas para os nossos parâmetros de comportamento e da forma de ver e sentir as coisas? Muito complicado. Não sei se quero brincar disso.
Acho mesmo que o grande mistério, a grande graça nessa brincadeira de viver é o estar sempre procurando esse “entender a vida”. Boa piada, rsrs. Meio difícil, mas algo que parece, todos correm para obter. E como não fazê-lo? Isso é intrínseco do ser um ser humano, com todas as suas dúvidas, questionamentos e incompreensões a respeito disso, ou daquilo. Nada detém a fome de entender as coisas e o que mais transtorna um ser humano é o não entender o porquê de certos acontecimentos. É frustrante não ter uma explicação para o que se nos acontece, sempre. Os mais emocionais diriam: “isso é bobagem, as coisas são assim e pronto. Não tem graça uma vida toda explicadinha”. Os mais racionais, por sua vez, sentenciariam do alto de sua “sabedoria”: “é necessário a compreensão dos acontecimentos e comportamentos para um bom viver, um viver mais seguro e tranqüilo”. Nossa! Isso pode acabar com a surpresa diária do ser humano, que nunca sabe com o quê vai encontrar nessa vivência e muito menos ainda com que tipos de comportamentos terão de lidar (comportamentos alheios, é claro). Sim, porque lidar com o comportamento próprio é uma sucessão de incógnitas diárias. Sempre somos alvos de “eventos surpresas” em nossa jornada. Talvez exatamente aí, nos eventos surpresas, sobre os quais não temos quase nenhum controle, é que resida a graça de viver o ser ser humano.
Vamos lá, encaremos a verdade suprema: NUNCA nos entenderemos sempre. Ao mesmo tempo que tentamos “controlar” o mundo à nossa volta, sempre existe o fator surpresa das pessoas ou acontecimentos que nos envolvem. Ser um ser humano é divino, é um espetáculo à parte nessa terra que tanto nos dá e que nos tira também.
Paremos com essa busca frenética e alucinada de tentar entender o que é viver a vida de um ser humano de forma tão acadêmica. Tentemos algo. Quem sabe, sentar à beira do mar, junto àquele riacho cristalino da nossa infância e nos entregarmos a mais deliciosa das atividades do ser um ser humano: vamos tentar ENTENDER, sem estresse, o que é ser um ser humano com todas as incompreensões que só os humanos são capazes de ter em relação a si e aos outros.

Livia

sábado, 3 de outubro de 2009

Crepúsculo


Estranho quando somos assaltados por uma notícia do desaparecimento de alguém a quem temos qualquer tipo de afeto que, quanto mais intenso, mais dolorido é o despreendimento.
Os dias, o tempo longe de casa, do que acontece, e sem que se possa fazer nada parece um infindável crepúsculo, nebuloso, interminável para o nosso desejo de estar com os que amamos e dizer "até mais" para quem nunca mais veremos, não em terra.
Podemos estar trabalhando do outro lado do país, não incomunicáveis, mas com a certeza de que nem sempre os nossos nos dirão o que de fato acontece onde eles estão.
Comandando equipe de trabalho onde nenhuma estratégia planejada deveria sair fora do programa, tudo correndo perfeitamente em harmonia e sincronizadamente. Perfeito. Trabalho excelente. Missão cumprida.
Chegava a hora do retorno, mas algo havia de estranho e não era palpável, não era tangível ao meu parco conhecimento dos acontecimentos que se desenrolavam longe, apenas uma sensação incompreensível de que algo, em casa, estava totalmente fora do planejado e nada mais era possível saber, mesmo com telefonemas, tudo era estranho e perigosamente calmo, tranquilo demais. Mas a sensação angustiante estava lá. A turma grita: "vamos passear na praia, a noite está uma delícia. Venha !" Convite recusado. Existia algo no ar e nem um resquício do que pudesse ser a notícia que, tinha-se certeza, não seria nada boa.
Havia algo a ser descoberto, a ser dito por aqueles que queriam, e nem sabiam se pudiam, interromper o trabalho e ter você de volta. Não quiseram avisar, não sabiam se seria possível voltar. Esperaram, angustiadamente.
Atravessado o "continente" Brasil, chegamos na terra santa, a que nos recebe de braços abertos mas com os olhos marejados. "O que será que acontece ?". Nada, dirão, não até a manhã seguinte. Que seja. O cansaço era brutal e já não era mais possivel conectar as ideias. Aguardemos.
Na manhã seguinte a notícia que, sabia eu, não queria ter. Não havia tempo para lágrimas, nem desespero. Ali começava a perder a capacidade de sentir. Havia, racionalmente planejadas, atitudes e decisões a serem tomadas. Os sentimentos foram guardados para depois (sabe-se lá quando). Iniciar um processo de idas, vindas e incógnitas. Nada animador, nada que devesse ser encarado como esperança de um retorno vitorioso. E assim foi, tudo racionalmente planejado, apesar de tudo ter saído da forma indevida, pelo menos para os meus desejos e dos meus, dos que me aguardavam com notícias animadoras que nunca vieram.
Fomos todos vencidos, derrotados. Tudo foi uma grande e frustrante corrida aérea e terrestre para um desfecho inevitável, terrível. Ali, no retorno da última viagem, parei de sentir muito e tanto. Recolhi a palheta das cores com as quais pintava minhas telas. Nem mais céus, mares, nem noites. Apenas a lembrança, essa sim, colorida, querida.
Somente um lamento: nao ter dito, muitas vezes, eu amo você.
Ao demais, aguardar o retorno das cores e de notícias mais alegres e coloridas, rsrsrsrs que virão, mesmo que discretas.

Saudações a vc, à sua vida e a dos seus, sempre.

Livia

A Paz do seu Sorriso


Recolhida, no meu próprio silêncio, observo a noite e seus murmúrios.
A lua prateada nos céus, as diáfanas nuvens que a envolvem e desvelam, sucessivamente, os carros que passam em direções diversas, a vida que pulsa de diversas formas ainda a esta hora e sempre!

Meus olhos buscam a linha do horizonte, confundem-se com a copa das árvores enquanto minha mente salta até seu rosto e se pergunta o que fará agora: lerá um bom livro, periódico ou verá televisão? Ouvirá, como eu, o sussurro da noite escondida entre caixas de tintas, pequenas asas de aeromodelos, passos de crianças, reuniões de família?

Quase nada sei de sua rotina, de sua vida, do que faz ou gosta de fazer. Nossos mundos interceptam-se em fugazes, intensos, momentos. Eternidades que duram minutos, segundos cheios de brilho incandescente capazes de alimentar a alma até que se possam repetir.
Então me lembro do seu rosto sorridente, dos seus olhos brilhantes, das suas mãos firmes, tão decididas ao volante quanto num delicado carinho. Penso no seu abraço protetor e suave e nas vezes que ouvi tons de tristeza maculando a beleza cristalina da sua voz...

Há muito tempo sei dos seus gracejos, como sei do seu tom de comando. Da sua bondade e da sua justiça, da sua parcial imparcialidade, características que a cada dia, mais e mais, me fazem admirar você e seu rosto me surge diante dos olhos, emoldurado pelas palmas de minhas mãos e o menino que caçava onças está ali, atrás das suas retinas.
Quem seria capaz de entender a alegria que se instala no meu peito ao observar-lhe assim? Ao ver-lhe sorridente menino cujo time de futebol conquistou o campeonato?

Quem entenderia a alegria que me enche o peito ao ver seu sorriso escondido nos seus olhos, seu corpo largado, cansado e feliz, e a gargalhada contida que escorrega pelo canto dos seus lábios?
Nada além de um instante e mal lhe percebo ali, querendo saltar exuberante, já você novamente se reveste estendendo o braço conciliador, protetor e num sorriso me aconchegando e seus olhos fechados, seu rosto em perfeita harmonia me transportam a uma sensação de suavidade e ternura que nunca antes experimentei.

É nestas horas que entendo o que seja a paz que todos almejamos e pouquíssimos temos a possibilidade de encontrar ou desfrutar por minutos que seja.
Nestes momentos entendo que a paz pode estar contida num sorriso, num abraço, nos olhos fechados ou num rosto sereno.
A paz, para mim, reside num rosto de homem que sorri pelos olhos!

Thamar

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Insopitável


Muitas imagens me chegam à mente, dançam como labaredas de uma fogueira ardente, misturam-se como as cores de uma palheta louca.

O corpo esguio, pelo ângulo observado, a aparência túrgida dos músculos a flor da pele, os cabelos suaves, levemente desalinhados e o cheiro da pele capaz de resistir a qualquer banho ou perfume.

Assalta-me a lembrança do filme perfume de mulher – mais uma seqüência de imagens – e asseguro a mim mesma que deveria ser feito um filme chamado perfume de homem. Eu indicaria você para ser o principal personagem. Perfume de homem ou a sinfonia de uma sedução.

Perco-me pelos cheiros, pelas imagens, por tudo que representa o prazer sensorial da sua presença, por tudo que significa o prazer surreal, sutil e emocional de estar em tão bela companhia e uma ânsia crescente e quase insana surge em mim.

Queria beijar-te a boca nesse exato momento. Beijar-te sofregamente até perder os sentidos, evadindo-me da consciência da realidade para existir apenas e tão somente na sensação crescente de ser possuída pela sua boca, explorada pelas suas mãos, arrebatada por esse redemoinho que se apossa dos corpos no fogo da paixão.

A insanidade cresce e toma conta de mim. Fecho os olhos tentando afugentar o que me vem de mais forte: a imagem do teu corpo sobre o meu! Belíssimo espécime de homem a beijar-me o corpo como se fora rosa visitada por um faminto beija-flor.

O desejo cresce em ondas vertiginosas lembrando-me apropriada crônica lida ainda mais cedo. Insopitável é a palavra que se amoldaria perfeitamente pelo exótico que tem , pela propriedade do sentido, pela incoerência que dela exala.

Um insopitável desejo de aconchegar-me entre os teus braços entregando-te toda a feminilidade que há em mim, abrindo-te todas as entranhas, intimidades, porções de mim mesma para, sendo tua, pertencer cada vez mais a mim...

Estendo as mãos sem alcançar-te e que não estais aqui eu já sabia. Nada custa tentar o jogo do faz de conta que, como tantas e tantas vezes já instastes para que o fizesse. Não adiante, quero a ti, aqui ! Quero tuas mãos a medir a dimensão das minhas profundezas, os teus dedos a queimar-me a pele e a tua boca – ah, a tua boca tem um beijo indefinível – a arrebatar-me a consciência lançando-me numa espiral de puro prazer...