Olho meus sobrinhos agora e fico pensando... onde vou encontrar uma árvore?
Outro dia recebi um e-mail perguntando como eu tinha sobrevivido se nasci antes de 1990? Pois antigamente não existia obrigatoriedade para cintos de segurança, fiscalização de brinquedos, bebidas, enfim, essa parafernália industrial, consumista e cada vez mais paranóica que é o nosso mundo. Resposta: sobrevivi porque subi em árvores!
Você deve estar achando essa resposta sem sentido, mas deixe-me explicar.
Sobrevivemos (e vamos pensar aqui no plural - eu, meus irmãos, amigos, etc.) porque corríamos, andávamos de bicicleta, montávamos nossos próprios brinquedos, criávamos personagens no nosso mundo real e éramos destemidos.
Nossos anjos da guarda viviam realmente ocupados enquanto o bando todo desembestava ladeira abaixo para se jogar de bico no primeiro riacho que encontrasse. Assim vivemos nossa infância sem medo de ladrões, de sequestros relãmpagos, de tarados e crack - sem computador, fast-food e celulares. Colesterol, cancer e stress -que é isso???
Subir em árvores era o máximo. Simplesmente trepávamos nos galhos e ficávamos lá em cima, curtindo a vista e esperando o tempo passar. E trepar ainda era escalar!
Aqueles que não conseguiam ficavam em baixo gritando, incentivando, xingando, enquanto lá em cima nós achávamos que o mundo era nosso... e era mesmo!
Como seria hoje, subir em uma árvore?
Bom, considerando que já nem se enontram árvores para subir, se isso acontecer vai ser um grande acontecimento. Vai ter provavelmene um adulto (lider) gritando - desce! Isso é perigoso! Você quer se matar menina! Melhor jogar video game.
Sem contar que as árvores não são fiscalizadas pelo Inmetro para saber se podem ser escaladas ou não.
E não vamos esquecer o planejamento - Primeiro precisamos conhecer a árvore, sua origem, idade, se oferece segurança ou não. Vamos precisar de uma mochila com milhões de ferramentas inúteis, uma caixa de primeiro socorros, cordas, escadas, chamar os bombeiros, fazer uma inscrição na prefeitura, tirar licença no Ibama, chamar a imprensa.
Depois vem a escalada, tudo muito seguro, dentro dos padrões de segurança, assistido pela família, seguindo as normas técnicas, com aquelas palavrinhas incentivadoras... bota o pé aí, minha filha! Aí não, bobona! Segura mais em cima, cabeça dura!
Enquanto a criança sobe, sufocada pela preocupação sonora, não aproveita os encantos da natureza, passa por uma formiga e não vê, não observa os detalhes do tronco, não assimila a anatomia das folhas, não percebe o ninho de pássaros, não fantasia, não comunga com seu próprio corpo.
Chegando lá em cima recebe uma saraivada de aplausos nervosos e conselhos gritados - segura firme! Não vá cair! Senta-se e olha para baixo preocupada com a descida. Nem percebe o horizonte, nem o que está a sua volta.
Enquanto tenta equilibrar-se no galho alguém lá em baixo preocupa-se com sua descida. Infelizmente é assim que se vive hoje. Perde-se tempo planejando demais, preocupando-se demasiadamente com estatísticas e o tempo se esvai e leva a empolgação, a euforia, a alegria do momento.
No caminho da subida não prestam atenção aos detalhes importantes. E antes de chegarem ao final querem desistir. Incorporam esse comportamento nas relações pessoais. São impessoais, irresponsáveis, superficiais e desleais. Não sabem o que é subir em árvoes e descobrir as joaninhas.
Para aqueles que subiram em árvores como eu, lembrem-se da felicidade genuína em viver a escalada em todos os momentos.
Nos pequenos arranhões cobertos com band-aid. Na sensação do vento no rosto, da aspereza dos galhos nos braços, nas pernas, a liberdade de ser!
Na confiança dos amigos e nossa volta, rindo e apontando a borboleta noutro galho.
E na subida, quando alguém na frente sempre gritava, destemidamente, encorajando: "Quem chegar por último é mulher o padre!"
E a risada era nossa oração!
Elaine
Julho 2009
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